terça-feira, 11 de maio de 2010

Pois então escrevo

Não escrevo por bom senso e nem por ter sentido, o contrário: escrevo porque perdi parte da capacidade de impor medo aos meus medos, de gritar o que desejo na Rua dos Sem Vergonhas, porque perdi tempo sendo outra pessoa que era eu, que ainda sou e serei o tempo todo (na contrariedade e nos erros de minha espécie).
Escrevo porque assumo parte da culpa de meus devaneios afônicos, porque perdi o interesse por palavras como 'confiança' e 'mentira', porque assumi o compromisso de realizar alguma missão antes de nascer, nascendo, depois de nascer, depois de continuar nascendo, depois de morrer e depois de mudar mais algumas tantas vezes por todo esse ciclo poderoso (que lê-se melhor "perigoso").
Escrevo porque não faço idéia do que eu faço, então preciso registrar e tornar público para receber ou não o julgamento alheio. Escrevo porque não falo de amor quase nunca, nem quase sempre, nem quase não-nunca e nem quase não-sempre, porque ser gauche na vida dá poucos e raros amigos e porque meus olhos acompanham a alergia sistemática da minha filosofia. Escrevo porque a minha ideologia é pouca, é fácil, domável, substituível, mutável, porque meus parentes são fofoqueiros e os meus pais quase sempre amáveis.
Escrevo por ser um vagabundo que não gosta de enganar, que aprendeu a beber, fumar, doer e sangrar, que não tem armadura de ferro e nem sonhos em qualquer país maravilhoso. Eu só sei que escrevo para (as)sumir em paz com essa praga que é viver e para tentar saber que um dia eu soube tentar.

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