quarta-feira, 18 de agosto de 2010

JOHNNY

Recompôs o seu próprio bigode, penteou os cabelos mais do que de costume, mas tudo automático, nó cego em seus desajeitados sapatos que constantemente teimavam e desfaziam seu próprio rumo. Não sonhava tão muito, nem dormia tão pouco. Voltara-se para a filosofia, mas mais ainda para um ceticismo amotinado que empalidecera e envelhecera alguns costumes. Nas noites mais escuras das retinas do tempo, voltava-se para a leitura acabada, destroçada, diminuída nos ritmos de solidão.
Queria muito mais que os pêsames singulares de propriedade privada, por isso irritava as cordas vocais com agudos debaixo d'água "achuveirada". Foi assim que encontrara-se nos quentes chás sedativos de meia noite. Se beber era remédio, não sabia, mas preenchera-se sempre de qualquer fervor que o tocasse nos lábios.
O piso escorregadio nunca negara todos os passos vitoriosos daquele que sumira-se na vida. Vendia a vontade de prosseguir. Usava-a ainda, isto é fato, mas por mero descaso, desacato à personalidade que ali reinava. Podia muito bem vender, isso mesmo. Livrarias o contemplavam em esquisitisse, metido com livros infantis, de aventura, de magia. O problema era a falta de sonhos, compensava-a comendo as páginas da imaginação fértil de algum autor. Ao invés de "O Príncipe", segurava sim "O Pequeno Príncipe" entre as mãos trêmulas devido a euforia.
Observava apenas o que tocava, o que acontecia ao seu redor; não-tocado era de pouca importância. Entre pesssoas e mais pessoas, parado perpetuamente continuara. Continuaria sempre pela estranheza de seu nariz empinado, do preto e branco ao seu redor que não ousava mudar de tonalidade. Afinal, a época era de poucos e muitos valores que não se decidiam apenas com uma camomila. Fitou todas as prateleiras, escorregou os dedos macios e sem calos por alguns livros e, finalmente, decidiu "O mágico de Oz". Teria gostado de conhecer alguma Dorothy por um caminho de tijolos amarelos.
Virou-se de lado para admirar a capa e acabou sendo esbarrado por uma jovem, de cabelos castanhos (quase loiros), sobrancelha feita e lábios carmim que sorriam sensualmente. Pondo-se inteiramente atento pelo tato sensível, segurou-a, por um instante, pousando seus olhos cobiçosos no xadrez da existência carmim.
- Desculpa - Disse, por fim, a jovem, com um sotaque lascivo. Enquanto ambos olhos fitavam-se demasiadamente.
- Não, não! Tudo bem, não foi nada. Qual seu nome?
- Gilda. E o seu?
- Johnny.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Rouxinol

Sentei no meu pranto
pra colher certas ternuras,
e decertas foram as lágrimas
que me caíam bestamente
pelos cantos olhados
no meu mundo diferente.

Sentei na minha vida
e observei
com aguardente na mão,
que não tomei.

Vibrei com o passarinho,
piava piava
no seu ninho,
soava soava
bem acolhido,
bem amado,
bem vivido!

- Não te esqueço...
dizia a saudade a cada canto;
até no canto da parede, do sofá,
da sala de estar, da cama.
Dizia vibrante e entre águas diferentes
no seu último suspiro:
- Te amo.


terça-feira, 20 de julho de 2010

surrupiaram meu coração

e que malícia tinha o ladrão
que na intimidade de parceiro meu
resolveu me aconselhar:
"fecha os olhos e aproveita, amigo"

surrupiaram meu coração com tanta força
que recordo até hoje;
de forma manhosa, baixinha
ele veio descansar

surrupiaram isso que eu tenho de melhor
isso que eu não abro mão
surrupiaram meu coração

e tão delicado como uma flor
e tão nomeado, afamado, afagado, afogado, agoniado, aquietado (se tornou) como uma flor
eu aproveito até hoje...

para Flora Borlot

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Tem chovido

De alguns olhares delirantes,
temi o passo adiante
que a minha mente não deixou tomar.

Vastidão, óh, eu encontro,
da doença, da amargura,
das pedrinhas valiosas,
do meu canto.
Tudo eu busco na palma delicada e estendida certeiramente

- Estou cansado, meu Deus.
Dizia tão alto, tão insolente
como se precisasse do ouvido
d'um parceiro metido a
se calar na multidão
- Estou farto dos fatos,
dos laços, das perseguições já vividas.

Pôs a mão na cabeça;
coçou pra lá,
coçou pra cá.
Coçou tanto, e nada resolveu.
Coçou cansado e sempre atônito,
e mediante a vasta afonia, eu
eu percebi encolhida,
num meio sonso sorriso, a funéria decepção.

- Já é tarde para a tal esquerda, se não sabe,
não entende, não atende, dispense a validez.
Digeri o quase óbvio que minhas conquistas reservaram.
Digeri atentamente, lentamente, engoli seco.
E não estava quente ou frio, estava seco.
Sem sexo, sem tumidez...
Sem mim. Deus desabou.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Durma bem...

A insanidade Dele também me dá segurança, a insanidade deles me torna mais são, mais puro, até mais humano. O que seria de mim sem a minha alma? Que personalidade é essa que me provoca? Me acalma saber quantos ainda virão. Quantos ainda terão chances, terão medos, enfrentarão qualquer coisa por amor... Quantos ainda viverão o que eu não posso viver. Ou qualquer coisa melhor que torne-os inteiros, qualquer coisa que não funcione como anestesia instantânea (desequilíbrio de base). Qualquer coisa que funcione como uma máquina de perdão, entre amigos e colegas que você nunca decifrará. Entre pessoas que você acha conhecer. Entre sistemas que ainda serão burlados e notas em papel de um bom dia pela falta de tempo no mundo (su)real. Entre o que você escolhe, o que você prioriza, porque as pessoas tomam decisões. E eu escolhi ser o que sou; esse é o mundo real.

(Escrito no Twitter. Follow me: @rafasady)

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Vale ressaltar

Não aceito mais as divagações constantes,
dos meus olhos que saltitam
na passarela de algum dom.
Sem pouco quebranto
que me torne frágil como cristal,
que me afogue nas constantes silhuetas analisadas.

Vale ressaltar a solidez das palavras cortantes;
aquelas cruzaram o líquido pesado
e iam escorrendo tão rapidamente sem me permitir parar.

E só pedi um parar.

As nuvens quase tão estreitas e desajeitadas
trouxeram a água que faltava,
trouxeram tantas vezes, molharam tantos passos
de um caminho perdido aqui.
O todo perto do que eu procuro,
o mundo para eu nunca encontrar.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Validade

Não são onde as coisas se encontram, não são o que elas fazem, não são lembranças, não são as temeridades que impedem um sujeito. E o vulgar toma o espaço ambíguo, toma o espaço por inteiro, nessa atividade que o perigo não destina, que o incerto não aponta. Talvez alguma lucidez te cure, mas não arrisco os meus talvezes, porque eles são sempre tão infelizes quanto os meus calcanhares doídos. Não te peço perdão por falta de palavras e até de culpa, falta culpa, falta tudo em mim que não preenche e me torna vazio. Falta uma ansiedade, porque a certeza é tão grande que o conformismo denota surpresa, me torna forçado a viver o que não digo que é vida. Mas vivo pelo que me acostumei a ver. Isso eu guardo.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Fragilidade contundente

Remanesce uma luz
dentro de mim,
uma fronteira pesada
cercada de construções lunáticas.

Remanesce o desejo de não desistir,
pois o de não existir
esvaiu-se no momento em que
não soube mais o que restou.

Viram-se as pontes,
da velhice que não perco.
Ponho-me inteira,
sedenta de passos firmes.
Completo-me na brisa folgada,
nas estrelas que sobraram dessa cidade
"tão avançada" que construí.

Não vejo a minha mãe há tempos,
há vidas.
Desconheci o prazer de tê-la por perto,
porque não desconheço mais,
porque não me conheço mais.

Num espelho quebrado,
desenhei com o dedo indicador
soltando um bafo úmido e simpático:
"onde estou?"

Só Deus sabe.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Pedidos

Não há presença que dure para sempre, apenas um futuro imperfeito que nos consome com a espera. Há uma falta, um inconformismo. Olhar utópico. Pede-se paciência aos desavisados, não para desenvolver uma pseudo-idealização de outro plano, não para aceitar, nem amadurecer. Pede-se paciência apenas, paciência em respeito a liberdade, paciência em respeito a diversidade. Pede-se paciência para que possamos compreender o lado oposto sem descaracterizá-lo, sem falsificar ou tomar medidas de ódio extremo.
Na vida, quase nunca teremos os méritos de personificações pacíficas, talvez cheguemos àquelas ambiciosas, o fingimento parcial. O que talvez seja necessário num âmbito em que a intolerância e a tolerância só sejam vistas de modo agressivo. Talvez precisemos respeitar o espaço intolerante também, sem reprimí-lo do que nos ofende, sem a violência característica daqueles que julgamos intolerantes... Transformaria-nos neles.
Não é o nosso dever discutir a maldade alheia, não é o nosso dever definir o que é mau. Ser bom por gostar de ser, não como obrigação. Fazer-se entendido, fazer-se claro, formar-se como cidadão, como competente, produzir o necessário, produzir a sua altura e crescer. Crescer para onde? Crescer para qualquer lugar. Pois aqui afirmamo-nos humanos, seres de um dedinho polegar opositor. Aqui nos firmamos dotados de uma massa encefálica quase completa ao meu ver, uma massa que chega a ser pefeita numa definição esdrúxula. Perde-se o amor resoluto, ganham-se as questões, abstraem-se as significâncias para o mundo interno, este mundo populoso. Para que, no final do dia, possamos deitar e agradecer a vida não-eterna que o ontem nos obrigou a ter.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Há conselho

O limite do vento
na esquina do torto:
delicadamente partido em dois.

As qualidades dos meus tormentos
surraram a passagem
que foi sussurrada.

Pelo asfalto quente,
esperei a noite chegar.
Fumaça saindo como devaneio.
Fumaça solta, expulsa do corpo.

Pronuncio algumas palavras.
Sem fervor,
volto recluso
aos batimentos.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Não sou nobre

Nesse teu ápice de beleza,
já prosa sofrida
te contei.

Do nosso amor,
eu só deixei crescer
o olvidado, a emoção.

Nos traços ilimitados que desenhei no papel preso,
nunca acompanhei
as mil e uma loucuras
que teus braços viveram.

Nego paixão certeira.
- Que te atinja lentamente!
Nego veneno ou encanto.
Nego o eterno pranto
que teus olhos irão curar.
Nego estas dores casuais.

Assumo o voto,
grito, boto pra lá,
boto pra cá.
Mas não noto que
a sua cegueira há de haver.

Morro como um vassalo,
morro como um escravo,
como classe baixa e pobre,
que altruísmo nenhum me impede.


Morto aqui estou.


Nenhuma surpresa te dei
ao cantar sabião,
porque de pássaro negas
o que sou,
o que estou.

Valha-me tantas tristezas,
que você não me dá.

Traz mais um fiasco?
Eu hei de honrar.

Como a velhinha debaixo da cama:
que voltou para a cadeira,
mas nada esperou.
Como homem grande: que veio,
que foi
e que deixou

Sátira desse floreio de idéias,
eu teço a carmim,
porque no fundo sei:
tu não és o meu jasmim.
Sem o perfume que me vicia,
perco novamente
e ponho-me tão contente;

como tão vivo,
vivo vôo.

Nada mais que presente
e nada mais que ausente,
eu entendo o teu caminhar.

Num obrigado cheio de ternura
de voltar para o abrigo
que destruí,
mas também ergui:

esse sim é meu.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

O Pequeno Príncipe

Alguns cachinhos dourados
entrelaçados na mente pequena
que o maior provocou,
entre as tempestades dos dias de hoje.

Algumas poucas respostas,
cheias de perguntas
e histórias,
quase floráticas,
quase perfumáticas.

Ele pediu tantos carneirinhos,
mas no caminho das pedras
cobra encontrou.

Algum veneno mortal,
que dormiu na sede de amor do principezinho,
deslizava bem aqui
(nesse cais de auroras extremamente enxutas).

E no finzinho desse amor,
que é o minúsculo planeta,
fugindo de dentro do pequeno
existe saudade...
de uma única rosa que ele ama.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Pois então escrevo

Não escrevo por bom senso e nem por ter sentido, o contrário: escrevo porque perdi parte da capacidade de impor medo aos meus medos, de gritar o que desejo na Rua dos Sem Vergonhas, porque perdi tempo sendo outra pessoa que era eu, que ainda sou e serei o tempo todo (na contrariedade e nos erros de minha espécie).
Escrevo porque assumo parte da culpa de meus devaneios afônicos, porque perdi o interesse por palavras como 'confiança' e 'mentira', porque assumi o compromisso de realizar alguma missão antes de nascer, nascendo, depois de nascer, depois de continuar nascendo, depois de morrer e depois de mudar mais algumas tantas vezes por todo esse ciclo poderoso (que lê-se melhor "perigoso").
Escrevo porque não faço idéia do que eu faço, então preciso registrar e tornar público para receber ou não o julgamento alheio. Escrevo porque não falo de amor quase nunca, nem quase sempre, nem quase não-nunca e nem quase não-sempre, porque ser gauche na vida dá poucos e raros amigos e porque meus olhos acompanham a alergia sistemática da minha filosofia. Escrevo porque a minha ideologia é pouca, é fácil, domável, substituível, mutável, porque meus parentes são fofoqueiros e os meus pais quase sempre amáveis.
Escrevo por ser um vagabundo que não gosta de enganar, que aprendeu a beber, fumar, doer e sangrar, que não tem armadura de ferro e nem sonhos em qualquer país maravilhoso. Eu só sei que escrevo para (as)sumir em paz com essa praga que é viver e para tentar saber que um dia eu soube tentar.

Soneto libidinoso

Vir de ti,
a salivação matinal
cursando o rumo,
em muda excitação.

Vindo aqui
compreender
o produto de uma soma
herética:

da carne que queima
e do riso de esgueira,
me ponho a sussurrar.

O lascivo por um triz
que o jovem carrega
no flerte do jeans: gosto.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Permanência

No dilúvio de quebrar as peças do que os raios fizeram, sabedoria ficou, salvou a vida de quem pediu a mais, de quem pediu por favor. No mais quente ápice épico de claridão, quem poderia não quis cumprir, mas quem cumpriu se fez suficiente. No que há de se dar, o humano que peca, do caso à parte e da pedra à vida, nenhuma era cenozóica sobreviverá. O que ninguém explicou como razão de ser começo, sem os motivos, nem os termos efetivamente supracitados. Só combinaram de ter o herói, nos construíram heróis neste mundo de prazer. Da distância, ao rever que o ponto de partida diluiu, fez-se escolher o mais novo caráter para o que o jogo quer cumprir. Sob as chamas da novidade, durante qualquer mudança: novo ou velho... perante o que eu vi.

domingo, 2 de maio de 2010

Por que amar?

É porque amar faz bem, faz surgir o humano que há em você e faz você carregar tudo que é bom (sobre você, em você).
Porque amar vai te levar a uma outra dimensão; e uma hora você precisará percorrer este caminho.
Porque amar vai te deixar mole, vai fazer seu coração sangrar, vai te fazer cantar, chorar e contar histórias de como o seu passado foi horrível antes desse sentimento chegar.
É porque falar de amor é como falar do azar que você teve no Natal anterior: não te traz boas recordações, mas você sempre acredita que um melhor possa vir; o que faríamos sem o Papai Noel?
É porque quanto maior a dor de amar e ser amado, mais você quer, apesar de sempre dizer "eu não acredito mais no amor".
É porque por mais contraditório que ele seja e por mais contraditório que seja falar dele, nada o supera.
E também porque quando você dorme, você saberá se está sendo amado.
Porque quando você perde, você luta até o ponto em que é possível e quando você foge, você acha que o melhor caminho é voar.
Porque você nunca vai notar as melhores coisas simples que já aconteceram antes delas acontecerem e você saberá sobre todas as coisas que te fazem sentir completo, mas também todas as coisas que te fazem dizer "já basta".
E você vai precisar de culpa, você vai precisar de medo, você vai precisar ser o mais ser humano possível para ter a honra de sentir amor. Você vai precisar ser ou não. Mentira. Você precisa apenas nascer. E você pode odiar, se quiser. Você pode matar e até morrer algum dia, mas você saberá quando acontecer. Nunca, nunca, nunca será tarde.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

minúsculas

na infinidade de tudo o que poderia te dizer violentamente, reprimo. indicaria sinais como uma forma de melhorar o que não foi cumprido devidamente. há mais solubilidade entre a liberdade, doçura e o choro do que no parar no meio de uma porta errada, com chaves inúteis.
os olhares se perderão como um sentimento comum, como perspectivas de destinos e planos espalhafatosos.
nós, os palhaços, possuídos pelos nossos carmas individuais, participando de alguns carros alegóricos que entoam o medo de nossas verdades. nada como o veludo, o conforto de ser especial. tu melhor danças no escuro, enquanto chovem os dias na tua sobriedade. no tanto que o tempo tem e se cumpre. mas esvai-se, torna-se, alega-se, propõe-se. como sol. sem queimar todos os esquemas suficientes que tragam paz. dói-se, perde-se, inunda-se, cede-se. no meio de tudo que pedra nenhuma impediu. perdão.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Lucidez

Não haverá um só desastre
entre as palavras não ditas,
nem entre a repressão escrita.

Sem os dias de glória
sem as noites de folga,
não existirá a guerra,
nem rirão da fome
de quando em quando
e de apenas em apenas.

Somente um incentivo tornar-se-á
dono das escadas que a imaginação produz.
E, sim, estará contra os degraus
que erigem nitidamente
todos opostos aos narcisistas.

Quem encontra o sossego perceptor,
quem envolve o tato,
mais que química tem,
mais que sentimentalismo,
mais que conceitos quebrados,
cortados,
ligados,
fundados em tudo o que a essência já permitiu julgar.

E a causa do medo
encontrar-se-á nas linhas perdidas
que ninguém explica,
que ninguém entende,
que ninguém obtem obtusamente,
mas que todo mundo quer indicar.

Mais que frio,
gelo
e morte,
eles transformarão tudo em todo,
enquanto os dias iniciais
durarem mais do que a suficiência
de serem os mesmos.

sábado, 24 de abril de 2010

Fernando Bonassi - Folha de São Paulo, 06/05/98

Eu escrevo porque tenho raiva. Escrevo porque tenho medo. Porque tenho fome. Eu escrevo porque fazer um filme é caro e demorado demais. Eu escrevo porque pra fazer um filme, via de regra, é preciso beijar a mão de canalhas presidentes, canalhas secretários de Estado, canalhas prefeitos... Escrevo porque a mão dos canalhas que beijei tinha gosto de ovo podre. Eu escrevo para burilar minha burrice infinita. Pra não ser vítima da minha própria crueldade. Eu escrevo porque a vida vai ficando cada vez mais enrolada, ao contrário do que meu pai dizia, e assim é como se eu estivesse num trem rápido, com meio corpo pra fora, tentando agarrar os matos do caminho. Eu escrevo porque me acho melhor que os outros... e sofro de vergonha. Escrevo porque de uns tempos pra cá começaram a me dar algum dinheiro por isso. Eu escrevo para humilhar as pessoas que não gosto. Eu escrevo porque pareço ter acesso a mais profundezas trágicas e úmidas do que se fizesse pontes, móveis ou sapatos. Escrevo porque nunca fui bom em esportes, tenho tique no rosto e meu cabelo cresce torto. Eu escrevo porque não tenho útero e não posso ser mãe de nada. Eu escrevo pra um dia poder parar com essa frescura de escrever e viver comigo. Simplesmente. Feliz como uma vaca feliz. Sem texto, sem droga nenhuma.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Rafa's Anatomy

Talvez não contaremos mais quantas vezes vamos nos apaixonar. Talvez os televisores informarão as nossas próprias tempestades e tragédias algum dia. Talvez o que é de verdade e o que transpira bondade possa demorar a chegar... Mas nós sempre sobreviveremos. E essa paz que nos consola agora será cada vez mais intensa, enquanto o prazer de nossos vícios estiver aqui.

terça-feira, 20 de abril de 2010

ponto de encontro

queria eu poder mais
queria eu todas as doses
os preços
a culpa
queria sentir mais que só
somado a necessidade do bastante

do suficiente
eu queria entender
do ausente
queria ocupar a vaga que o estacionamento
de minha vida paralela
deixa pendente

e da cegueira que me acolhe
carregada
de um dois
menor que um inteiro
maior que a caída partícula
do sentir apertado
suscito alegria

do meu cheiro queria você
de você queria a lembrança

só lembrar
porque ainda estou aqui

(tu) querias mais perguntas do que término

e é mais "que" enrolado;
sem explicação
do porquê de ser anaforicamente correto

sem vácuo preso;
mais oculto
mais sombrio
e conquistador

sem solitude pura
nem solidão que dure
ou tempo que cure

sem Edward Hopper
nem roupas de viagem
ou dicotomias que apareçam em néon

maior que a dignidade assolada
e menor que a aguda ferocidade

não passa do público
por medo de ser outrem
não entra no mar
pois o mar é grande
e a dor não ocupa
aguada permanece

não preenche bagagem
não disfarça motim
não morre
nem mata

e apenas vive


sábado, 17 de abril de 2010

Cem meia luas na noite

Suntuoasamente uno a mente ao coração. Uso a magnanimidade do que me cobre, o tecido fino, a sandália frágil que calça e conforta. O livro ainda cheira a nós. Fatidicamente flutuei. Ou apenas insisto por precaução? Nada ao oposto de ser fim preocupa-me, nada que venha a ter o bridão de um alazão certeiro, que cerque, que prenda... Nada como matar por ilusão. E a culpa não te assustará nos dias de meia lua.
Nos dias de vento, ponha-se a secar o que sobrou de alguns pensamentos. Conforme-se com a felicidade que conseguir, acompanhe-a ao medo sempre que se perder, mas não a corrompa.
Nas minhas artérias incontáveis, ainda pulsam alguns sentimentos, ainda soam alguns ruídos, mas a integridade do que foi esquematizado por conceitos intracranianos me reprime silenciosamente. E, no momento seguinte, as duas vozes se unem, as músicas unem-se aos corpos, esbaldindo todo e qualquer preceito subvertido.
E não me contendo em imaginar a prosa, também viro. Viro por ser humano. Viro homem pequeno. Viro o pequeno príncipe. E não teimo em terminar o que digo, porque disso tudo só me sobra a razão.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Prosa do desdobramento de mim*

Sem poesia melodramática, sem satisfação de ego, sem paredes pintadas, sem banheiro privado, sem dicionários, calendários, tempo nulo... tempo preso, sem papel e caneta, mas com um teclado bastante hábil. É assim que eu me vejo: sem explicação, sem fortes remédios que detenham uma dor de cabeça consecutivamente esclarecida. Sem poesia deliberada. Uma poesia inventada, achada, roubada. Uma poesia mentirosa, que dói, mas que acalma. Sem sensibilidade repetida (ou pelo menos demonstrada), sem hibérboles, metáforas, onomatopéias, não, não, não... Sem ruídos. Surdo, mudo, cego, pálido, mas com alguns olhares na noite em que o tormento de sonhos BONS (sim, eram bons), de olhares bons... de apetite sexual, do desejo de ser sensual. Sem vazio. Mas incompleto. Inconstante como o Kauam, forte como a Alanie, paciente como a Flora, severo como o Álvaro e doce como o Ruan. Sem imposição. Pulsante, carnívoro, carente, ambíguo. Sem poesias novas. Com as mesmas de antes, diante de um desenvolvimento diferente. Cem minutos esperando, cem horas, cem dias vai esperar. Sem língua dobrada, mas com um incrível grito preso. Sem amor pessoal, mas com alguns impessoais. Sem complexidade. Não, chega de complexidade. Chega de mistério, chega de verbalização... Prefiro as letras, prefiro o signo explícito. Prefiro esse signo tatuado. Prefiro o símbolo, o digno. Chega de discurso e discussão. Chega de maquinação. Chega, apenas.

*nota: título de autoria de Alanie S. Ramos Mineiro.

sábado, 10 de abril de 2010

Carta

Querido Deus,

Venho por meio desta carta-virtual fazer alguns pedidos e ressaltar alguns pontos. É bem raro esse negócio de enviar cartas ao Senhor. Nem sempre chega, né? Até o Sedex falha de vez em quando... Muitas vezes observo pessoas nas ruas gritando o Seu nome enlouquecidamente, mas pensei em fazer diferente. Por um instante de perda ou por uma pequena solidariedade e reconhecimento social, devo-te suplicar um muito de pão aos inocentes, um pouco de culpa aos injustos, um minuto de esperança aos desesperados. Sei que nada disso é culpa do Senhor e que nós criamos essa parafernalha a que chamamos de mundo (eu chamo de submundo).
As horas cada vez mais rápidas tornam anciosos os homens, e eu estou aqui. E é tão difícil, Pai, de disseminar o amor e construir a fraternidade. Te peço abrigo aos pobres, sabedoria a todos nós ignorantes, compreensão aos incorformados. Solicito, às 03:00h, mais água no planeta, menos guerra (sem espeficações), algumas doses de paciência, carinho, fidelidade. Algumas doses de sentimentos bons para quem acordou sem nada. Algumas doses de confiança, equilíbrio, valorização.
E sei que é pedir muito, Senhor, mas eu esperarei por uma mudança gradual. Peço menos imaturidade sempre, mais consciência (palava de sentido próprio para cada um) e umas verdades, umas verdades inundadas de bondade. Mas também peço-te desculpas pelo incômodo... Perdão pela culpa, pela fragilidade. E muito em breve, Senhor, prometo-te uma carta de agradecimentos (porque esta tenho a certeza de que será maior).

Muitos beijos e muitos cheiros no Teu cangote,
Rafael Sady




quarta-feira, 7 de abril de 2010

A liberdade do Thomaz

(23:31) thomaz:
Porque tu és assim?
Tão doce e gentil.
Não vejo mais aquela dureza que outrora existia.

Oh leão, não há mais bravura.
Agora vejo a ti na mais bela flor.
Que se permitires, coloco no mais belo vaso.
E prometo cuidar com o maior carinho.

Mas não há vaso. Na falta de um, te guardo no meu coração.
O que me importa, na verdade, é que estejas seguro e bem pertinho de mim.
(23:34) raaaaafs !: Que lindo. ._.
(23:35) raaaaafs !: É seu?
(23:35) thomaz: Acabei de escrever, pra você!
(23:35) raaaaafs !: Meu Deus, que lindo.
(23:36) raaaaafs !: Sem palavras. @_@
(23:36) raaaaafs !: Chega me arrepiei quando li. UHAHUA
(23:36) raaaaafs !: Sério.
(23:37) raaaaafs !: UHAUHA Aii, vou postar no meu blog. /x3
(23:37) raaaaafs !: Deixar registrado lá.
(23:37) thomaz: Foi tão expontâneo e tão sincero. Que assim, até eu fiquei sem palavras agora.
Mas acho que já disse tudo, né?
(23:38) raaaaafs !: Ahaaaaaaaaaaam. /ç;
(23:38) raaaaafs !: Ai, fiquei empolgado. /zz
(23:39) thomaz: Você que me motivou a escrever. *-* E olha só o que saiu. Até que não ficou tão mal.
Acabei de descobrir que você me inspira!
(23:40) raaaaafs !: É mais gostoso quando sai espontâneo do que quando sai pensado, né?
(23:41) thomaz: Bem mais. *-*
(23:41) thomaz: Ai, tô feliz! hahahahaha
(23:42) raaaaafs !: Que bom. *-*

perspectiva

o homem na janela com o cigarro
seu isqueiro acende
no meio, entre noite e vento,
uma única chama
aquece o corpo do homem

o homem na janela sai por um momento
o vento, a chuva
dissipam todas as idéias conscientes
no medo, no tempo
acender o cigarro é só uma distração

o cigarro teima alguns minutos
poucos
entre o vento
o tragar
e o soltar

o cigarro aceso na imensidão
somente visto por outro alguém
que por um minuto
decidiu ir a janela

Nan, você é a mais gata e divertida.
MEU HOMEM COM CIGARRO, te amo, ok?

terça-feira, 6 de abril de 2010

Desmotiva(n)do, ele desmotiva.

Quase ingênuo, quase intocável. Tão quase perto de ser ele mesmo, mas resiste. E não falo de mim dessa vez. Não me contento só a me criticar mentalmente. Poeticamente infalível ele é. Ele é tanto, tanta coisa, tanta simplicidade que não se contém SOMENTE num sim ou não. Não se contenta apenas no permanecer, mas são estáticos os sentimentos. Eles sobem, descem, caem, viram, mas permanecem fincados a um único e poderoso coração. Gostaria de ajudar, mas não posso.
Meras palavras se despedem dissipadas nesse ar incontido daquela mesma amarugem de estruturas anteriores. Não se forja o explícito, não se anulam as acepções internas, humanas, naturais e sobrenaturais. Não pode-se ser tão nobre esta alma pesada, porque naqueles olhos mesquinhos, naqueles olhos que se recusam a sorrirem livremente, ele tenta encontrar significados.
Se explicações fossem válidas, indicaria-lhe dicionários e gramáticas práticas, porque assim a absorção de todos esses conflitos se daria de forma natural. Mas tu és duro. Uma pedra de gelo roxa, que não deseja apenas se derreter... Não manche seu carisma com teu roxo! Não manche a sua vida (que para ti até seja insignificante, mas alguns outros pobres - não nobres - a merecem). Elevo-te a grande poeta, elevo-te a sentimentalista do século, mas não roube a felicidade de faces repressivas. Instintivamente, desloque-se pela brisa de outonos saudáveis, pelos anos aceitáveis de uma velhice surpreendentemente boa. Não tenhas medo de ser feliz, por isso sejas por si só.

quarta-feira, 31 de março de 2010

e se...

e se eu não permitir me entender, faça isso por mim!
porque na minha infinita ingenuidade
sou aquilo o que der,
sou o menor que vier
e vários faróis de ilusão.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Pequena poesia futurista

Vai ficando velho quem eu só conheço de vista, e meus amigos continuam inteiros. Esforçados, meus amigos. Ainda os vejo sorrirem pelos lábios expressivos e dizerem aquele "eu te amo" com tanto prazer. Ainda os vejo sendo inteligentes e patetas (só às vezes). Esses amigos guerreiros que cultivo à minha altura, esses grandes amigos que não cabem numa única partitura musical. Os corações de meus amigos? Ainda praticam a sístole e diástole com o mesmo prazer dos 17. Não precisam mais enrugar a testa para um questionamento, sai totalmente natural, mas quão jovens meus amigos ainda permanecem...!!! Eles que ainda guardam o mesmo sentimento, a mesma eloquência, o mesmo perdão, o carinho, minha gente, que só meus bons novos amigos possuem. Os outros ficarão velhos, meus amigos ainda estão frescos bem aqui em minha mente. Meus amigos ainda somam cada partícula da massa cinzenta que possuo abaixo de meus próprios pensamentos e acima de minhas lágrimas. Não morrerão meus amigos, eles não se sujeitarão a tal artimanha. Eles são espertos e sabem que vão sobreviver nesse fio mental tecido pela consciência física versus espírito. Como são jovens meus amigos... Como são lindos.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Pássaro-rei

Sou um rei de olhos vermelhos, penas azuis e um bico afiado.
Minhas penas quase nunca cobrem a minha poesia.
E essa coisa toda de jogar a solidão de lado não tá dando certo; tenho algumas palavras não criadas dentro de mim, que nunca saltarão para fora de todas as minhas têmporas extremamente pálidas.
O preciosismo de meu canto nunca passará despercebido, nunca escapará de promessas.
Entre a desmotivação arteira, a imagem de algumas memórias serão temporárias.
Sou um pássaro-rei com asas mais resistentes no vento, sem lágrimas no outono ou seca.
Sou moda de precisão e o medo sarcástico do lado de fora; mas sou doce no ainda, sou fixo no permanecer e puro no escuro.
Sou pequeno em tamanho, mas existe a interioridade de meus pensamentos: estas são maiores que as nebulosas difusas do espaço.
Sou o suor mais intenso do verão, sou ou tenho a força e a graça de cordas vocais roucas, sou mais amarelo do que um girassol, menos problema do que solução, mais Amor do que qualquer amor.
Sim, e eu vôo.

quarta-feira, 24 de março de 2010

raaaaafs !(filme.) diz:
giram as minhas idéias
nos meus milhões de corações
giram tão rapidamente
que me balança a estrutura
giram para trás
para o vento que eu não vejo
às minhas costas
o meu sustento sem calor;
apenas uma garganta inflamada
grita a ilusão
de te ver deitado
em minha cama
coberta por meus sonhos rotineiros
coberta por minha vida dormida
gritam esses desejos num barulho contínuo
que faz-me levantar mais de uma vez
para clamar essas palavras
numa só
dose de amor
raaaaafs ! (filme.) diz:
Que tal?
Alanie Ramos diz:
Tava transando Rafa ?
raaaaafs ! diz:
UHAHUHAU Não.
Alanie Ramos diz:
Poema super pós sexo.
raaaaafs ! diz:
Tava observando o ventilador.
raaaaafs ! diz:
UHAHUAUHAHUUAHHUA

terça-feira, 23 de março de 2010

domingo, 21 de março de 2010

Golpeado

No escuro as minhas palavras são somente minhas, os meus textos escapam, borbulham, cegam, destroem, mas me recompoem algumas energias indispensáveis à vida. O brilhinho que meus olhos provocam em cenas de amor é tão premeditado quanto a gravidade de seus erros futuros.
Me sinto sozinho, sem vergonha, sem medo, sem os mesmos erros. Me sinto frágil. Não há mais sinceridade maldita, não há mais verdade escondida, não existem mais metáforas rarefeitas, nem hipérboles repetidas. Não consigo mais ser poeticamente convencível. Não consigo mais.
Algum fardo está irresistivelmente atraente. Alguns olhares tetérrimos me caem em lembrança, me mudam as esperanças, me dão notícias daquelas pessoas que me afirmavam os melhores sentimentos transcritos numa só tarde amena.
Que pedra tão pesada Drummond me deu, que raiva, que angústia. Maldito seja Drummond! Maldito coração menor que o mundo... Maldito seja esse choro vadio que me internou e internalizou em continuidade.
Esses golpes finais... Esses finais... me farão unicamente invencível, eu sei. Quando a compota de rios for despejada no mais belo momento de brilhos externos, serei invencível. Assim que o vidro se despedaçar e o esquisito se tornar estático, impiedosamente deitado acima de todos que abençoam seus próprios corações, serei eu...
Sim, estou ficando velho.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

É-rei!

Ser feliz não tem cura, é como a magia de ser pequeno e nem perceber. E cheio de coisas nas mãos, e cheio de coisas derrubadas, é assim que consigo ser rei. É assim que aprendo a dar ordens. Porque existem tantos garotos complicados para entender o que é sofrer? É só a metamorfose da rainha, tentando relembrar a princesa que já foi; há meio palmo de tempos nas mãos. Não é tão complicado de sonhar, basta deitar dormir e pensar. E vão dizer que sou bobo por amar... A qualquer tempo existirão flores, rosas, flores e rosas, cores, cores, flores, sabores, sons, flores e rosas. Ser feliz é aprender a ser flora, a dizer nan quando possível e o pê que aprendi do alfabeto. É saber que em todo lugar existe algum garoto chamado Álvaro, mas único é o que eu conheço. Ser rainha é dizer: U-RURU! E pensar que nunca mais vou ver isso aqui de novo, é momento, é aquele momento das flores. E se perguntarem se tenho coração? Haha, de SOBRA.